quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Fazer Faculdade É Um Bom Investimento?

Wharton School - University of Pennsylvania
Published: November 2, 2011


Estamos passando por uma espécie de bolha na educação [...] uma bolha tão nociva quanto as que tivemos no setor de tecnologia, nos anos 90, e no setor imobiliário nos anos 2000.
-Peter Thiel, cofundador da PayPal.
Em todos os estudos feitos, os dados são claros. O ensino superior aumenta significativamente o potencial de renda.
-Vivek Wadhwa, educador e empreendedor.
É uma questão de bom senso. O que se pretende é dar às pessoas a oportunidade de fazer a escolha que consideram certa.
-Eric Bradlow, professor de marketing da Wharton.
A importância do ensino superior está sob ataque. Embora o número de estudantes americanos matriculados nas faculdades seja maior do que nunca, uma conjunção rara de fatores tais como elevação de custos, crescimento da dívida estudantil e encolhimento das perspectivas de emprego, tem levado um número cada vez maior de críticos a se perguntar se o investimento em um curso superior continua a ser um bom negócio.
Peter Thiel, um dos fundadores da PayPal é um dos principais críticos desse tipo de investimento. Para ele, o ensino superior se tornou uma bolha perigosa. Thiel, formado pela Universidade de Stanford com especialização em direito, decidiu pôr em prática o que pensa: está concedendo bolsas de dois anos no valor de US$ 100.000 a 20 empreendedores jovens para que desenvolvam suas ideias de negócios em vez de ir para a faculdade. A exemplo de outras bolhas, a do ensino superior "caracteriza-se por custos descontrolados em que as pessoas pagam cada vez mais por algo cuja qualidade não melhorou", disse Thiel em 12 de outubro por ocasião de um debate em Chicago patrocinado pelo site Intelligence Squared U.S.
Os defensores do ensino de terceiro grau contra-atacam dizendo que a formação superior nunca foi tão importante, uma vez que os empregadores exigem um grau de estudos e treinamento avançado dos trabalhadores de uma economia que hoje é global e pautada pela tecnologia. "A China e a Índia estão formando pessoas em nível superior", observa Vivek Wadhwa, pesquisador da Universidade Duke, Faculdade de Direito de Harvard e da Universidade da Califórnia, em Berkeley. "Se os EUA decidirem baixar o grau de exigência escolar no país, enquanto nas demais nações do mundo o nível da educação é cada vez mais elevado, seremos uma futura nação do terceiro mundo", avalia Wadhwa, fundador de duas empresas de software.
Pouca gente coloca em dúvida o valor econômico de um ensino, no mínimo, superior ao ensino médio, uma vez que a renda tende a subir acentuadamente com a aquisição de estudos de nível superior. Resta saber quem se beneficiará de uma experiência de quatro anos proporcionada pelo ensino superior, e quais seriam as alternativas viáveis. "Não há um caminho único até a linha de chegada", observa Eric Bradlow, professor de marketing da Wharton. "O sistema educacional deveria propiciar numerosas oportunidades."
O debate tem como pano de fundo as rápidas mudanças decorrentes da automação incessante, da terceirização do emprego e, por vezes, de dados conflitantes sobre o impacto de tais mudanças. Segue-se uma análise dos principais elementos de ambos os lados da discussão sobre a importância, ou não, de se fazer um curso superior.
O preço dos estudos vem de fato subindo assustadoramente. Os gastos e as taxas   com instrução nas faculdades e universidades americanas subiram 439% em dólares atuais de 1982 a 2007, de acordo com um relatório de 2008 do Centro Nacional de Políticas Públicas e Educação Superior de San José, na Califórnia. O valor superou o aumento de 251% dos custos com saúde no mesmo período, e foi cerca de três vezes maior do que o crescimento da renda familiar média.
Embora o valor de US$ 50.000 ou mais cobrado pelas faculdades e universidades privadas de elite tenha merecido destaque nos meios de comunicação, os aumentos atingiram fortemente as escolas públicas que acolhem cerca de ¾ dos universitários americanos. Os estados com problemas de caixa contribuem com esse aumento ao reduzir a verba destinada à educação e ao transferir para os alunos um volume maior do financiamento da conta a ser paga. Os gastos e taxas com instrução, por exemplo, mais do que duplicaram na Universidade da Califórnia desde 2005, gerando protestos de estudantes no campus de Berkeley recentemente.
Com a elevação dos custos, cresceu também o volume da dívida. Em média, os universitários que se formaram em 2009 acumularam US$ 24.000 em crédito educativo, um aumento de 6% em relação ao ano anterior, conforme dados do Instituto de Acesso & Sucesso Universitário de Oakland, Califórnia. O presidente Barack Obama disse que usará sua autoridade executiva na elaboração de um projeto que permita diminuir o valor dos empréstimos de muitos dos contratantes, além de oferecer opções adicionais de consolidação e de reduzir o tempo depois do qual a dívida restante é perdoada.
Quadro de emprego sombrio
Além de ter de arcar com uma dívida enorme, os formados têm pela frente um mercado de trabalho difícil como não se via em muitos anos. Dados levantados pelo Centro de Estudos do Mercado de Trabalho da Universidade Northwestern mostram uma queda na participação de formados com menos de 25 anos que conseguiram emprego: em 2000, esse percentual era de 81%; já de outubro de 2010 a março de 2011, o valor registrado foi de 74,4%. O percentual de formandos recentes com emprego que exige ensino superior caiu mais ainda, de 59,7% em 2000, para 45,9%, sinal de que alguns formados foram trabalhar como garçons ou manobristas.
Enquanto isso, a automação e a terceirização de empregos dos EUA para outros países estão modificando o local de trabalho. O Excel, da Microsoft, realiza hoje tarefas que exigiam antigamente a contratação de programadores pelas empresas, observa Peter Cappelli. A tecnologia da computação facilitou o deslocamento para o exterior de posições ocupadas por funcionários de colarinho branco. É comum que radiologistas de Bangalore, na Índia, façam a leitura de raios X hospitalares, acrescenta Cappelli, enquanto trabalhadores das Filipinas cuidam de tarefas administrativas de bancos americanos.
Tendências desse tipo tendem a acelerar. "O volume de empregos terceirizados vai crescer cada vez mais", avalia Alan Blinder, economista da Universidade de Princeton. Os formados que provavelmente mais sofrerão serão aqueles "que foram obrigados a cursar o ensino superior", e que acabarão em empregos da área de programação facilmente terceirizáveis, diz Blinder. Essas pessoas serão forçadas a competir com gente que ganha pouco em outros países, o que "deprecia o retorno" do investimento feito na faculdade.
Esse tipo de aluno teria mais a ganhar se usasse suas habilidades num curso de eletricista, carpinteiro ou encanador, diz Blinder. "No entanto, se alguém me perguntasse se seria melhor mandar mais ou menos jovens para a universidade", acrescenta, "eu diria que mais é melhor, mas não 100%".
O consolo é que a renda tende a aumentar com a elevação do nível de estudos. "As evidências empíricas são claras nesse ponto", observa Anthony Carnevale, diretor do Centro Educativo e de Força de Trabalho da Universidade de Georgetown. "Um diploma hoje vale cerca de US$ 1,2 milhão mais do que um diploma de ensino médio" em termos de renda média ao longo da vida, diz Carnevale, enquanto praticamente qualquer curso de terceiro grau pode elevar a renda. Uma pessoa com curso superior de dois anos de duração vale cerca de US$ 425.000 mais do que outra com diploma de ensino médio, por exemplo, enquanto os que abandonaram a faculdade têm chances de ganhar US$ 240.000 a mais do que quem parou no ensino médio.
É claro que essas estimativas admitem inúmeras variações. Um engenheiro da área de petróleo sem nenhuma especialização ganha, em média, US$ 120.000 por ano, isto é, mais do que três vezes a renda média de US$ 36.000 de uma pessoa que dá aulas na pré-escola depois de fazer pós-graduado na área de educação infantil. "A área em que a pessoa faz pós-graduação é extremamente importante", diz Carnevale.
Há pessoas que se formam no ensino superior e ganham menos do que outras que só têm diploma do ensino médio. Um eletricista que não cursou a faculdade chega a ganhar, em média, US$ 1,8 milhão ao longo da vida, de acordo com dados da Universidade de Georgetown, comparado com US$ 1,5 milhão de um corretor de imóveis com curso superior sem especialização.
A educação superior traz benefícios adicionais, dizem os defensores do terceiro grau. "Na faculdade", observa Wadhwa, "a pessoa aprende diversas disciplinas: marketing, matemática, entre outras coisas. Elas ampliam os horizontes do indivíduo e lhe dão uma base para que ele desenvolva outros conhecimentos".
Isso será fundamental em uma economia em ritmo de mudança, diz Cappelli. "O problema básico é a incerteza em relação ao mercado de trabalho no futuro. Isso reforça a importância de aprender, de se adaptar e de adquirir novos conhecimentos, o que parece apontar para a necessidade de cursar o ensino superior."
Tornando-se um empreendedor
Thiel disse em Chicago que, a princípio, só contratava gente formada em universidades de ponta para as vagas disponíveis na PayPal. Depois, aos poucos, mudou de opinião. "Vi tanta gente talentosa no Vale do Silício que não havia feito curso superior e que se saiu tão bem. Elas eram mais criativas em alguns aspectos e não tinham de arcar com dívidas enormes de crédito educativo. Isso parece ter inspirado, em parte, a concessão de bolsas de estudos da Thiel Fellowship, permitindo assim que jovens empreendedores desenvolvam suas ideias empresariais em vez de ir para a universidade.
Os céticos questionam essa estratégia. "Qual a vantagem de pedir aos jovens que abram uma empresa aos 18 anos, em vez de fazê-lo aos 22?", indaga Cappelli. "Não dá para entender. O bom empreendedor é aquele que sabe o que está fazendo, que entende do setor em que atua e sabe decifrar a concorrência. Se a pessoa não tiver o ensino adequado, seja formalmente, seja na prática, não é possível que seja bem-sucedida."
Segundo Wadhwa, um estudo com cerca de 500 empresas de engenharia e de tecnologia do qual participou, mostra bem esse ponto. Foi constatado que asstartups lançadas por ex-universitários de 1995 a 2005 tiveram desempenho superior às startups lançadas no mesmo período por empreendedores com diploma de ensino médio apenas. As empresas criadas por ex-alunos do ensino médio tiveram vendas menores, em média, do que as vendas anuais e o número de empregados, em média, das startups em geral.
Se partirmos do princípio de que o ensino é, de fato, vital para o sucesso da economia global, há países parecem estar à frente do Tio Sam. Os EUA aparecem em sétimo lugar num total de 29 países avançados no percentual de jovens adultos matriculados em universidades; e em 15º. lugar no número de certificados e diplomas concedidos por 100 matriculados, conforme dados do Centro Nacional de Políticas e Educação Públicas.
A elevada taxa de desistência significa que muitos estudantes americanos precisam agora pagar os pesados empréstimos feitos sem o benefício de um diploma que os ajude a conseguir emprego. "Muita gente que faz faculdade não é bem-sucedida", observa Richard Vedder, economista da Universidade de Ohio e diretor do Centro de Acessibilidade e Produtividade Universitária de Washington, D.C. "Mais de 40% dos alunos não se formam no prazo de seis anos. Portanto, há um risco substancial associado ao curso superior."
Muita gente que se formou no ensino médio está buscando os community colleges à procura de treinamento vocacional e de uma chance de transferência para as instituições com cursos de quatro anos de duração. As matrículas nas escolas com cursos de dois anos passaram de 45% de todas as faculdades e universidades públicas americanas, em 1990, para cerca de 49% em 2009, conforme dados do Centro Nacional de Estatísticas de Educação (NCES).
Contudo, o valor cobrado pelos community colleges vem sofrendo pressões, já que os estados estão deixando de apoiá-los. "Essas instituições estão em grandes dificuldades", observa Laura Perna, professora da Escola de Graduação em Educação da Universidade da Pensilvânia. "Eles têm uma tradição de cobrar barato para facilitar o acesso mais amplo possível. Com o aumento dos valores, talvez não possam aceitar todos os que desejam se matricular."
Entre outras escolas que atraem os estudantes destacam-se as instituições com fins lucrativos como as Universidades de DeVry, Kaplan e Phoenix. A matrícula nessas instituições passou de 1,5% de todos os alunos matriculados em faculdades e universidades, em 1990, para 8,8% em 2009, conforme o NCES. As instituições com fins lucrativos atraem sobretudo famílias e estudantes negros de baixa renda, ressalta Perna, e estão passando por um "crescimento fantástico no número de matrículas".                 
Elas atraem também a ira dos críticos que acusam muitas delas de ter taxas baixas de formados e de colocação, além de níveis exorbitantes de dívida. Em junho, o governo Obama promulgou regras que exigem das instituições com fins lucrativos, cujos alunos obtiveram empréstimo federal, a demonstração de que os formados têm condições de satisfazer um certo nível de exigências de pagamento.
Perspectivas
O debate acalorado em torno do ensino superior, isto é, se se trata, ou não, de um bom investimento, deverá vir à tona a qualquer momento. Discute-se se as escolas, de dois ou de quatro anos, estariam produzindo gente em quantidade suficiente para atender a futuras necessidades profissionais. Embora o Centro Georgetown de Educação e Força de Trabalho diga que os EUA terão um déficit de três milhões de pessoas com nível superior em 2018, outros pesquisadores contestam a metodologia empregada nessa projeção e não veem escassez alguma mais à frente. Poucos, porém, duvidam de que algum tipo de educação pós-secundária seja vital para a economia de hoje. "É nossa obrigação cuidar para que todos possam estudar", diz Perna. "As diferentes trajetórias são todas elas preparativos para um trabalho significativo."

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